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O Brasil tem 10 anos para universalizar o acesso dos cidadãos ao saneamento básico. O Marco Legal do Saneamento, Lei 14.026/20, prevê que, até 2033, 99% da população brasileira deve ter acesso à água potável e 90% devem ter acesso à coleta e tratamento de esgoto.
Atualmente, no entanto, esse cenário é bastante diferente: mais de 15% da população brasileira não têm acesso à água tratada e 44% não têm acesso à coleta e tratamento de esgoto, de acordo com dados da 14ª edição do Ranking do Saneamento, publicado pelo Instituto Trata Brasil.
Segundo o estudo “Benefícios Econômicos e Sociais da Expansão do Saneamento Brasileiro 2022”, publicado recentemente pelo Instituto Trata Brasil em parceria com a consultoria Ex Ante, a universalização do saneamento básico pode gerar mais de R$ 1,4 trilhão em benefícios socioeconômicos para o Brasil em menos de 20 anos. As áreas que mais podem se beneficiar são: saúde, educação, produtividade do trabalho, turismo e a valorização imobiliária.
Pontos para você entender a lei
Veja abaixo os principais pontos para compreender a lei:
Política Nacional de Saneamento
Criação do CISB (Comitê Interministerial de Saneamento Básico); MDR responsável pela coordenação nacional e regulamentação da política federal: financiamento e recursos federais, capacidade econômico-financeira, Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento Básico (SINISA) e Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB); e ANA responsável por normas de referência para regulação.
Metas 2033: 99% da população com água potável e 90% com coleta e tratamento de esgotos
Meta de atendimento de 99% da população com água potável e de 90% da população com coleta e tratamento de esgotos até 31 de dezembro de 2033, com possibilidade de ampliar até 2040.
Uniformização da regulação: a Agência Nacional de Águas (ANA) assume um novo papel
A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) fica responsável pela edição de normas de referência para regulação, tendo o financiamento federal como indutor da adoção dessas normas pelas agências reguladoras infranacionais.
Incentivo à concessão da prestação de serviços (extinção contratos programa)
Extinção dos contratos de programa - modalidade entre as companhias estaduais e municípios - e expectativa de abertura do mercado de prestação dos serviços públicos de saneamento básico para a concorrência (empresas privadas); exigência de comprovação da capacidade econômico-financeira dos contratos atuais às metas de atendimento.
Regionalização da gestão dos serviços de saneamento básico
Regionalização da gestão dos serviços de saneamento básico e definição da titularidade dos serviços nos casos de interesse comum e interesse local.
Novas instâncias de governança serão criadas
Com as regionalizações da gestão do saneamento básico, novas instâncias de governança serão criadas e serão responsáveis pelas funções de deliberar sobre a prestação dos serviços, a regulação, os planos regionais de saneamento básico e as formas e instrumentos de controle social.
O controle social perde força no nível municipal e passa a ser regional
O controle social perde força no nível municipal e passa a ser regional (com grandes desafios).
Estados estão usando indicadores urbanos para modelagem de suas regionalizações
Outro aspecto a ser observado é que muitos estados estão usando indicadores urbanos para modelagem de suas regionalizações, o que pode ocultar a população rural no efetivo cumprimento das metas, em especial naqueles municipios com menores taxas de urbanização. Segundo estimativa do SNIS 2019, que utiliza a taxa de urbanização do CENSO de 2010, 1.619 municipios, ou 29% do total de municipios do país, possuem mais da metade de sua população rural. É preciso garantir que estas populações sejam consideradas nas metas.
Metas de Universalização
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Metas de universalização de atendimento de 99% da população com água potável e de 90% da população com coleta e tratamento de esgotos até 31 de dezembro de 2033.
A universalização já existia enquanto princípio na Lei nº 11.445/07, e a meta de 2033 para se atingir a universalização estava definida no Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB). Agora, a meta está incorporada no texto da lei, o que é pouco usual, e todos os contratos, em vigor e novos, provenientes de licitação para a concessão da prestação, estão condicionados à comprovação da capacidade econômico-financeira para viabilizar a meta de 2033.
As metas deverão ser observadas no âmbito municipal, quando a titularidade é exercida de maneira independente, ou no âmbito da prestação regionalizada. As metas regionais, entretanto, devem ser observadas com ressalvas, pois, os dados agregados de um conjunto de municípios não traduzem a realidade de cada município. A Região Metropolitana de São Paulo é um bom exemplo para ilustrar essas disparidades. Dos 39 municípios da metrópole paulista, 37 são atendidos pela SABESP. O atendimento total de água deste conjunto de municípios é de 98,4%, taxa muito próxima da meta de 99%. No entanto, a análise de cada município em separado permite verificar municípios com índices bem inferiores, como é o caso de Santa Isabel e Salesópolis que possuem índices de atendimento de água próximos a 60%.
Existe, ainda, a necessidade de se incluir nas metas a garantia de atendimento com água potável e esgotamento sanitário também nas áreas rurais. Da forma como é calculado pelo SNIS, considerando apenas os dados fornecidos pelo prestador dos serviços, os índices de atendimento urbano tendem a ser melhores do que os índices totais, que considera na soma a população rural, com menor acesso a serviços públicos de saneamento. Por exemplo, o índice de atendimento urbano de esgoto na Região Metropolitana de Salvador é de 78%, mas se for considerado o índice de atendimento total de esgoto, a média cai para 70%.
Outro aspecto a ser observado é que muitos estados estão usando indicadores urbanos para modelagem de suas regionalizações, o que pode ocultar a população rural no efetivo cumprimento das metas, em especial naqueles municípios com menores taxas de urbanização. Segundo estimativa do SNIS 2019, que utiliza a taxa de urbanização do CENSO de 2010, 1.619 municípios, ou 29% do total de municípios do país, possuem mais da metade de sua população rural. É preciso garantir que estas populações sejam consideradas nas metas.
Incentivo à entrada do setor privado
O incentivo à entrada do setor privado nos novos contratos de prestação por meio de concessões ou parcerias público-privadas (PPPs) e com a proibição de novos “contratos de programas” (modalidade de contrato feito diretamente entre as empresas públicas estaduais e os municípios).
O novo Marco Legal incentiva a participação de empresas privadas na prestação dos serviços públicos de saneamento básico ao exigir a seleção competitiva do prestador para novos contratos. Para tal, altera as possibilidades de escolha pelo titular das formas de prestação, bem como estabelece novos critérios para a validação de contratos, tanto dos vigentes como dos novos contratos a serem firmados.
A prestação, quando realizada por entidade que não integre a administração do titular, deve se dar necessariamente por meio de concessão, mediante prévia licitação.
Como estímulo às concessões, a lei ainda incorpora um conjunto de estratégias, como:
a proibição de novos contratos de programa entre municípios e empresas estaduais de saneamento básico (as antigas CESBs);
incentivos para financiamento e recursos para processos de concessão e parceria público-privada (PPP);
a exigência da capacidade econômico-financeira dos operadores e metas de atendimento para todos os contratos vigentes e novos, com base em uma metodologia definida por decreto, de forma pouco transparente e sem participação social. Foi realizada uma consulta pública em agosto de 2020, para a qual não foram encontrados registros da publicização antecipada, nem dos resultados obtidos.
Regionalização da Gestão dos Serviços
A prestação regionalizada dos serviços de saneamento (prestação integrada que envolve mais de um município) é um dos grandes eixos do novo Marco Legal.
A justificativa é garantir a viabilidade técnica e econômico-financeira dos serviços com o ganho de escala da prestação e a possibilidade de subsídios cruzados entre municípios mais superavitários e municípios menores e com população de menor poder aquisitivo (modelo comumente adotado pelas empresas estaduais). A lei busca impulsionar tal estratégia condicionando a alocação de recursos públicos federais e o financiamento com recursos da União à adesão dos municípios às regionalizações propostas pelos estados ou União.
Para tal, o novo Marco Legal apresenta diferentes arranjos de regionalização, incorpora o conceito de titularidade que, além da municipal, pode ser também por titularidade compartilhada (regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões) ou gestão associada (proposta na lei como unidades regionais de saneamento básico e blocos de referência).
Prazos a partir de 2023
2023
Até 31/03/2023 - Prazo para a conclusão das regionalizações de saneamento básico pelos estados da federação para fins de estarem aptos a receberem recursos oriundos da União.
2024
Até 31/03/2024 - Prazo para os titulares com contratos de prestação vigentes irregulares publicarem o edital de licitação para concessão dos serviços que substituirá o contrato irregular.
2025
Até 31/03/2025 - Prazo para os titulares com contratos de prestação vigentes irregulares substituírem os contratos de programa vigentes por contratos de concessão.
2033
Até 31/12/2033 - Prazo para que se atinja a meta de atendimento de 99% da população com água potável e de 90% da população com coleta e tratamento de esgotos.
Fontes:
- Observatório do Marco Legal do Saneamento.