Humanizando a Arquitetura para saúde: Hospital para as pessoas



Humanizando a Arquitetura para saúde: Hospital para as pessoas

A atualidade das discussões sobre os valores essenciais da função da Arquitetura na promoção da saúde pode ser percebida sob distintas formas de contribuição: elaboração de projeto e construção, manutenção contínua da edificação e instalações, pesquisas e avaliação sobre o edifício pós-ocupação (APO).

As experiências profissionais, por exemplo, trazem o processo pragmático do projeto e da construção numa forma de percepção mais direta, as edificações em toda sua complexidade funcional.

A experimentação da vivência diária no ambiente hospitalar, manutenção e operação, muitas vezes envolta em problemas físico-funcionais, permite identificar componentes a serem analisados continuamente. Neste caso, convive-se com adequações, reformas e ajustes que poderão nunca vir a existir. Outra forma de compreender os ambientes de saúde seria observá-los em ângulos distintos, como os das experimentações interiores. Um olhar que produza novas perspectivas.

 

Uma leitura que tem se tornado relevante entre especialistas e interessados em estudos sobre as edificações produzindo novas perspectivas de análise é o livro Cidades para as Pessoas (Cities for people), publicado no ano de 2013 pela Editora Perspectiva.

O autor é um arquiteto e urbanista dinamarquês, Jan Ghel  (1936 - ), professor universitário que promove uma percepção das cidades a partir dos usuários, das suas dimensões, sentidos e necessidades. Ele divide o tempo de se perceber as cidades e define três tipos de espaço para as mesmas: a cidade tradicional, a cidade invadida e a cidade reconquistada.

Em entrevista para o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) em 21 de junho de 2012, ele comenta: “Precisamos resgatar outros valores da cidade, valores humanos. Essas cidades reconquistadas, como as chamamos, são então caracterizadas pela busca de um bom equilíbrio entre três funções: um lugar de encontro para as pessoas, um lugar de mercado de bens e serviços e um lugar de mobilidade, onde se pode conectar diferentes espaços”.

O livro nos traz uma reflexão importante sobre a vida urbana, que também poderá ser utilizado em estudos análogos sobre os ambientes de saúde, como o hospital. Sobretudo os hospitais onde as internações são prolongadas, espaços que se transformam muitas vezes em local de viver.

Um hospital/cidade ou um hospital/residência para alguns usuários pode estar caracterizado como local onde as necessidades fundamentais inerentes à sobrevivência humana e à prática terapêutica devem estar disponíveis. E esta não é uma referência apenas às necessidades do paciente. Alguns profissionais de saúde também têm o hospital como espaço de viver, no amplo sentido que a palavra permita compreender, considerando o tempo que ali permanecem.

Ghel faz referências úteis na concepção projetual da arquitetura da cidade, igualmente aplicável para a cidade/hospital como a relação contraditória entre: reunir ou dispersar, integrar ou segregar, convidar ou repelir, abrir para ou encerrar, aumentar ou reduzir. Cada princípio do planejamento constitui um pré-requisito primordial ou “crucial”, como ele próprio comenta, para inclusão da efetiva dimensão humana e dos requisitos sensoriais aí contidos.


A adaptabilidade aqui proposta aos conceitos do Ghel descritos para a cidade na proposta de utilização nos ambientes hospitalares, também foram obtidas de outras referências que se iniciaram com estudiosos das dimensões humanas, como o antropólogo Robert Sommer. Este autor contribuiu com a criação de lugares adequados às necessidades de uma nova abordagem da assistência à saúde, considerando a relação entre espacialidade construída, conforto e comportamento espacial. Ou com as referências das “dimensões ocultas” do antropólogo norte americano Edwad T. Hall em The Silent Language (1973), uma das principais bases dos estudos ergonômicos e sua aplicabilidade contemporânea às variáveis antropométricas das zonas de viver.

Quais são as contribuições que o ambiente do hospital poderá fazer para a convivência humana que neste local se estabeleça?

Os componentes de qualidade do projeto do hospital não podem, de forma alguma, prescindir dos valores dos conceitos guarda-chuva de proteção, conforto e prazer. Conceitos ghelianos que podem ser adaptados às necessidades dos ambientes de saúde, a seguir:

Proteção: Proteção contra acidentes - sensação de segurança, proteção contra experiências sensoriais desconfortáveis.

Conforto: Oportunidade para caminhar ou sentar, ver, ouvir e conversar, praticar atividades físicas. Perceber e sentir os fatores ambientais

Prazer: Sentir-se em ambientes com a escala humana, aproveitar os aspectos positivos do clima e ter experiências sensoriais positivas.

Um exercício para os que lidam com o planejamento dos ambientes de saúde, deve ser conceber espaços que promovam a sensação de proteção, a percepção de conforto e experiência do prazer pelos aspectos acima descritos. E, sobretudo, resgatar os valores humanos necessários aos ambientes para assistência à saúde.



Fábio Bitencourt

Publicado em: Revista Health ARQ, Ano 6, Edição nº 18, www.healtharq.com.br

Dezembro/Janeiro/Fevereiro 2016, página 14-15.

Visitado em: https://issuu.com/grupomidia/docs/healtharq_18ed_site



Professor INBEC